O atacante aplica um drible desconcertante no zagueiro, que cai sentado na entrada da área. Avança, tira o goleiro da jogada com um incrível drible de corpo. A torcida fica de pé, pronta para festejar o gol de placa. Mas, surpreendentemente, o atacante faz três enbaixadinhas, curva-se e encaixa a bola na nuca. Em seguida, pega a redonda com as mãos e a arremessa para dentro do gol. O juiz, então, apita, marcando o toque, e anula tudo.
Pergunto: O que essa jogada inisitada tem a ver com o samba?
Respondo objetivamente: Mostra o excesso de preocupação com a “evolução” do espetáculo em detrimento de sua essência.
Tentarei explicar melhor. Se não me engano, a invasão da arte circense no samba começou com a comissão de frente formada pelas rãs da Intrépida Troupe, que inaugurava a Apoteose Brasileira (Villa-Lobos) da Mocidade, em 1999. Desde então, diversas agremiações têm recorrido a números circenses para dar maior dinâmica a setores estratégicos do desfile, notadamente às alegorias.
Nada contra. Creio que tanto o samba como a arte circense descendem do talento nato e, portanto, sempre encontrarão pontos comuns para caminharem juntos. Isso é louvável porque incentiva as Escolas a descobrirem novos valores nas suas comunidades. Não faz muito tempo, a Porto da Pedra chegou a manter uma escolinha de circo para os jovens de São Gonçalo, lembram-se?
O que me preocupa é o excessivo apoio aos artistas do circo, em detrimento dos artistas do samba. Acróbatas e malabaristas arrancam aplausos; passistas, no entanto, levam o público ao delírio.
Aos acróbatas e malabaristas reserva-se o nobre espaço da comissão de frente e das alegorias; aos passistas é atribuída a responsabilidade de preencher os buracos que se formam atrás da bateria e o que abre quando os ritmistas se recolhem no segundo boxe. Será que não existem outros espaços mais nobres além desses?
Temo que, dentro de pouco tempo, nossos jovens tenham mais estímulo em fazer malabarismos e acrobacias do que em desenvolver a arte que carregam nos pés. E, então, veremos nossos craques na cara do gol, tentando, bisonhamente, fazer gols com as mãos.
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